domingo, 2 de março de 2008

PROFESSORES E EDUCAÇÃO


(bibliotteca ALMEIDA GARRETT)
À PRESSA E À FORÇA
Fernando Madrinha/Expresso/2008.02.11
Burocrático, complexo, difícil de aplicar e com todas as condições para ser injusto, produzindo efeitos opostos àqueles que o Ministério pretende. É assim o sistema de avaliação de desempenho dos professores e qualquer pessoa o pode verificar lendo, não só o decreto regulamentar, como as fichas de avaliação e a parafernália de recomendações e decisões associadas.

Por exemplo, aquele despacho segundo o qual, não estando ainda constituído o Conselho Científico para a Avaliação dos Professores, previsto na lei, fica a presidente, até agora a única nomeada, a responder pelas restantes 20 pessoas que hão-de vir a integrar a referida entidade.

O que dizer de um sistema de avaliação que, para poder ser aplicado, obriga o Ministério a desvirtuar a lei que ele próprio elaborou? E o que pensar de um secretário de Estado que assim actua só para que tudo se faça à pressa e à força?

São múltiplos os aspectos práticos da avaliação que vêm perturbar ainda mais as escolas, como é o caso, por exemplo, de os professores avaliadores deverem assistir, neste ano lectivo 2007/2008, a pelo menos duas aulas dos colegas que vão avaliar. No limite, essa obrigação pode obrigar um professor a ter de faltar às suas próprias aulas para assistir às do avaliado, visto que o decreto só saiu no fim de Janeiro e os horários foram elaborados nas férias de Verão, podendo, portanto, sobrepor-se. Há também opções discutíveis, como a de os professores do último escalão serem avaliados como os outros: nada ficam a ganhar com uma avaliação excelente, mas podem ser penalizados se ela for negativa.

Mais importante e mais grave, porém, do que estas questões menores é a própria filosofia da avaliação. O desempenho do professor está praticamente indexado ao sucesso escolar dos alunos.

E isto que, em tese, parece fazer todo o sentido, na prática comporta o maior e mais perverso dos riscos, que é o de muitos professores começarem a trabalhar só para a avaliação. Se para ter boa nota for preciso dar boas notas aos alunos, mesmo sem estes as merecerem, é isso que farão os mais carreiristas e por tal serão recompensados. Ao invés, por darem notas menos boas, ainda que justas, muitos docentes podem ser prejudicados na avaliação do seu desempenho, não por serem menos capazes, mas por serem mais exigentes, mais honestos e até mais competentes.

Assim se promoverá uma injustiça e se dará uma nova machadada na qualidade do ensino.

A ministra Maria de Lurdes Rodrigues teve a coragem política de avançar com iniciativas necessárias para distinguir o trigo do joio no universo de pessoal docente. Mas com a urgência posta na aplicação de um sistema que nem sequer está devidamente regulado, faltando normas e regras previstas no próprio decreto regulamentar, corre o risco de desacreditar completamente o processo de avaliação. A insistência em aplicá-lo já este ano a trouxe-mouxe, só para o Ministério não perder a face, é a melhor forma de o matar

Publicação de
João Brito Sousa

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