quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

POLÍTICA. O TRATADO DE LISBOA

(este pelo menos fugui...)
OS COBRADORES DE PROMESSAS
por FILIPE LUÍS da VISÃO

Acabem-se as eleições e os partidos. Fazemos um concurso público para governar o Pais e ganha o consórcio que apresentar a solução mais barata. E que seja desinteressado, como as boas almas da CIP...

1 - «Nenhum dos senhores tem um mandato para ratificar o Tratado de Lisboa», disse Francisco Louçã, do alto da tribuna da Assembleia da República, durante o debate a propósito da moção de censura ao Governo, apresentada pelo Bloco de Esquerda. O Bloco insurge-se, talvez legitimamente, contra o facto de José Sócrates ter, alegadamente, faltado à promessa de convocar um referendo para ratificar o Tratado. Mas, desta vez, Louçã pisou o risco. Não apenas porque a frase nega, à partida, a legitimidade da democracia representativa - mas, também, porque, na hora da votação, o líder do bloco entrará em contradição consigo próprio. É que, dando de barato que nenhum deputado tem um mandato para aprovar o Tratado de Lisboa, e que essa decisão pertence ao povo, em votação directa, então também nenhum deputado tem um mandato para rejeitar o mesmo Tratado! O que fará o Bloco? Faltará à votação? Abster-se-á?

Em democracia representativa, é suposto confiar aos nossos eleitos e, lá está, representantes, que decidam sobre matérias que nos escapam. É para isso que eles lá estão. Acontece que os referendos europeus têm sempre leituras nacionais: ora funcionam, internamente, como cartão amarelo ou vermelho aos governos, ora como oportunidade para o protesto de sectores lesados por determinadas políticas comunitárias, ora como escape de paixões de extrema direita ou de extrema esquerda, que nunca se abstêm. (É por isso que os extremos do espectro político gostam tanto de referendos). Mas nunca, e por maioria de razão, nunca neste caso, que trata de um texto hermético, árido e quase ilegível para o comum do eleitor, o referendo serviria para aprovar ou reprovar qualquer tratado.

É simplesmente lírico – ou estão a gozar connosco - pensar que o eleitorado pode decidir, em consciência, se é a favor ou contra. Foi para resolver estes imbróglios que o mesmo eleitorado colocou lá 230 cabecinhas pensadoras, que dão pelo estatuto de deputados. Se não confiamos neles, porque votamos? É verdade que Sócrates prometeu, em 2005, um referendo. Fez mal.

Devia ter tido a coragem de fugir ao politicamente correcto e ao ar do tempo. Agora, é bem feito!
O único referendo europeu de que nunca se fala, mas que fazia realmente sentido, era perguntar aos portugueses, e, já agora, aos outros, se querem, ou não, continuar integrados na União Europeia. Os políticos do arco governativo asseguram que existe um consenso pró-europeu na sociedade portuguesa. Óptimo. Então vamos medir isso e acabar de vez com as dúvidas. Claro que nem pensar! Pela nossa posição na União. Pelas nossas razões de Estado. Pelo nosso modelo de desenvolvimento.

Pelo nosso papel no mundo. Pelos nossos valores comuns. Referendar a Europa seria como referendar a reintrodução da pena de morte: a Europa como que já faz parte dos valores inquestionáveis. E eu, insuspeito, porque convictamente europeísta, digo que não é assim.

Seja como for, o recurso à apresentação de uma moção de censura, só para manter viva a bandeira do referendo, embora politicamente legítimo, não deixa de ser um truque. Não estavam em causa políticas do Governo, mas sim o não cumprimento de uma promessa de um partido político em campanha eleitoral, e mesmo assim, formalmente referente a outro tratado. Ora, ninguém pode garantir, antes pelo contrário, que os portugueses votaram maioritariamente em José Sócrates só porque ele prometeu um referendo a um tratado constitucional europeu. Era bom que os portugueses fossem assim tão… «elaborados». Mas não são. É saudável que se cobre a promessa ou se confronte o primeiro-ministro com ela. Mas a figura da moção de censura não foi, definitivamente, feita para estas coisas. É verdade que o Bloco conseguiu mais 15 minutos de fama, controlando, por um dia, a agenda política e, já agora, levando a reboque o anestesiado PCP, que podia ter zurzido Sócrates sem votar a favor de Louçã. Mas o que passa para a opinião pública são umas quantas horas de chicana política.

O que está em causa, para o Bloco, não é já o referendo europeu, morto e enterrado. O que está em causa é a estratégia de cobrança de promessas a Sócrates e ao seu Governo. Inteligentemente, Louçã enumerou três promessas não cumpridas. É sempre bom invocar um número concreto: entra muito melhor no ouvido das pessoas. Emprego, impostos e referendo. E, com isto, iniciou a sua campanha para as legislativas de 2009. A estratégia é a de inundar a agenda com as promessas não cumpridas de Sócrates. Todos os meses, depois todas as semanas, finalmente, todos os dias.

Agora três promessas, amanhã dez, em 2009, 50. Para um eleitorado de memória curta, Louçã promete ser o despertador, o grilo falante e o relógio do tempo. E, no fim, se Sócrates ganhar sem maioria absoluta, lá estará o Bloco, para garantir que as promessas, desta vez, serão cumpridas.

Por via de uma coligação de poder pós-eleitoral.

2 – A história da mudança de agulha da Ota para Alcochete é uma história exemplar. Exemplar de como os recursos dos contribuintes são delapidados pela incompetência dos políticos e do Estado. Durante anos, o Estado estudou todas as localizações possíveis. Gastou rios de dinheiro em estudos. Tomou uma decisão e gastou rios de dinheiro a fundamentá-la. De repente, saída do nada, a sociedade civil, via CIP (Confederação da Indústria Portuguesa), apresenta uma solução melhor.

E, em seis meses, muda tudo. Mas andaram todos a dormir? A ganhar e a perder eleições, a constituir governos, a gastar dinheiro, a ganhar e perder de novo eleições e a constituir novos governos a gastar mais dinheiro… e vem um grupo de empresários com uma solução repentina de chave na mão? E ainda os políticos se desculpam, esfarrapadamente, que a Força Aérea não cedia o campo de tiro mas agora já cede? Mas quem é que manda na Força Aérea?!

Acabem-se as eleições e os partidos. Fazemos um concurso público para governar o Pais e ganha o consórcio que apresentar a solução mais barata. E que seja desinteressado, como as boas almas da CIP...

MEU COMENTÁRIO.

A política tem os dias contados. Tem Manuel Alegre com trinta anos de AR e duas ou três reformas... Os outros mais ou menos igual...

MARIA DA FONTE, PADEIRA DE ALJUBARROTA ou gente assim... é preciso. Doutra maneira não...


João Brito Sousa

1 comentário:

  1. O Tratado de Lisboa

    Referendá-lo?
    Porquê?! Para quê?!

    Eu estou de acordo aqui com o amigo Brito quando ele diz que "a política tem os dias contados!"

    E até estou de acordo, por via da concordância supra citada, com o autor do artigo quando refere:
    "Acabem-se as eleições e os partidos. Fazemos um concurso público para governar o Pais e ganha o consórcio que apresentar a solução mais barata."

    Teríamos assim gestores muito mais responsáveis e responsabilizáveis. Responsabilizáveis e imputáveis judicialmente sempre e quando houvesse desvios dos propósitos anunciados aquando da sua candidatura. Não bastaria ir à AR, deixar ditas umas tretas sobre os porquês dos desvios da inflacção ou do défice ou de qualquer outro imcumprimento eleitoralista e regressar ao convívio dos amigos com o espírito e a arrogância de que "o debate de hoje foi vencido", "destrocei os argumentos da oposição!".

    Civil e judicialmente condenáveis pelos erros cometidos; não apenas politicamente condenáveis, nas urnas das eleições seguintes ao terem deixado o país de tanga! Gostaria de ver! Votaria nesse sistema!

    Não votaria num referendo ao Tratado de Lisboa! Simplesmente porque não o conheço! E, ainda mais, porque não o quero conhecer! E ainda porque não voto por simpatia partidária mas, em consciência, naquilo que compreendo e julgo conhecer. Por esta mesma razão, defendo que algo como o Tratado de Lisboa não deve ser sujeito a referendo porquanto não é matéria que a generalidade dos portugueses votantes conheça e compreenda com capacidade suficiente para ajuizar dos seus interesses ou desvantagens para o País.

    Dou razão ao autor do artigo quando opina que as 230 "cabecinhas pensadoras - e, presume-se!, naturalmente conhecedoras - que os portugueses colocaram lá na AR, em sua representação, com dever de procuração para bem decidirem por eles, têm todo o direito a tomar a decisão de votar a favor ou contra o tal Tratado.

    Referendá-lo, porquê?!
    Deixámos de acreditar nas "cabecinhas pensadoras"?!

    Referendá-lo, para quê?!
    Para consumir mais uns largos milhares de Euros a este empobrecido país, receber os votos cegos dos seguidores partidários e deixar que uma faixa dos "partidáriamente não comprometidos" decida para que lado caia o resultado do referendo?!
    Não! Penso que o estar na Europa exige mais do que uma leviandade dessas.

    Disse!

    Arnaldo silva
    Felizmente reformado

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