quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

CONTOS DO NORTE

( poderia ser aqui a casa da avó do arlindinho)
O ARLINDINHO

Um pouco antes do animal chegar às mãos do das Bouças para o golpe fatal, chegou o Zé Grilo, um serviçal da casa, que tinha ido levar o Arlindinho, o irmão mais novo do Miguel, a casa da avó, porque este miúdo não se entendia com a matança dos animais, dizia que não podia suportar tais comportamentos do Homem, expresso nesta atitude de matança. Talvez porque uma vez o das Bouças errou o golpe, desferiu - o mais ao lado, o animal sacudiu – se e conseguiu arrancar pela horta fora. E foi o cabo dos trabalhos para se voltar de novo ao local do crime.

A postura de Arlindo era de inquietação, não percebia muito bem o que era isto da vida, para quê viver para quê morrer, o trabalho que dava estar vivo, inconsequentemente, interrogava-se a si próprio qual o prazer de viver e mesmo agora, já com 22 anos continuava sem perceber e sobretudo sem motivação para estar vivo. A matança do porco constituía um dia de festa para os outros mas para ele não e assim, preferia ir passá-los em casa da avó, onde a vida era mais leve, mais lógica, porque aí conseguia sentir prazer naquilo que fazia. A vida, para ser vida, tem de nos dar prazer.

Na altura da feira, pelo S. João, adquiria - se e consumiam-se cabritos e anhos para a festa da aldeia, havia a procissão e muito vinho mas... aquilo era coisa que não caía muito bem em Arlindinho, eram festas a mais... às vezes vinha-lhe à cabeça quem é que pagará isto, tanta festa, com algum retorno é certo, mas as coisas complicaram-se quando, ao passar num campo aberto onde havia alguns castanheiros por perto, o Licas, pastor vagabundo, matava a sangue frio os cordeiros para consumo na festa. Afinal.. a vida é só morte.... cogitava..

Arlindinho gostava era de ver as bandas de música, ora aí está uma coisa bonita, que dispõe bem, emprega pessoas, se não lhes der dinheiro dá-lhes pelo menos alimento ao espírito, é uma actividade dirigida aos outros, é meritório quem tiver uma actividade assim, onde não há exclusão mas sim alguma abrangência, onde as pessoas se podem entregar a uma situação de bem estar. E pensando assim, cogitava com os seus botões, ora aí está uma orientação para que se possa criar a tal sociedade do bem estar, onde os que têm mais poderiam e deveriam repartir com os carenciados, o que a eles lhes sobra.

Era neste terreno que se situava Arlindinho. Nunca tinha lido nada sobre o assunto, não sabia inclusivamente se havia alguém que já se tivesse lembrado disto... mas valia apenas pensar, ao menos.. Como fazer?.... E depois com conciliar as tarefas diárias que havia para executar com a concretização desses pensamentos. Ou seja, saber da existência de livros onde pudesse saciar o seu desejo de saber. Pensou e repensou e nada. Mas tinha uma certeza...ou quase certeza, que haveria possibilidades de saciar o seu espírito com coisas mais úteis do que a matança do porco, a festança que a rapaziada do seu tempo não queria perder por nada deste mundo É a tradição da aldeia.... e o pai fazia questão que ele estivesse presente.Mas...

Perguntou ainda o Pai ao Zé Grilo, então como é que deixaste o meu rapaz?... Mas já não ouviu a resposta. Era o Manel das Bouças que estava a tratar da “saúde” do animal... que emitia duros grunhidos.
Que o Arlindinho.lá longe pressentira...

João Brito Sousa

1 comentário:

  1. WASHINGTON CITY USA

    2008.01.03

    Na matança do porco, eu sentia-me na pessoa do teu Arlindinho....o que era para os outros uma festa, para mim nao passava de um assassinio de um pobre inocente
    que nem sequer tinha a hipotese de fugir....coitado era gordo e de perna curta.

    E eu tal como ele refugiava-me em casa de minha avo a 3 ou 4 km de
    distance e só voltava quando o revoltoso acto de abater e esquartejar o inocente havia terminado e nem rastos do sucedido se notava....a nao ser o
    encher dos chouriços uma semana mais tarde mas isso nao me recordo que me afectasse de sobremaneira.

    Ainda hoje sinto essa revolta mas,nao me impede de
    comer um bife.

    Contradicoes não é verdade?

    DIOGO

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