terça-feira, 4 de setembro de 2007

OS TRABALHOS NAS HORTAS

(horta das palmeiras do Bartolomeu em Pechão)
Quando os trabalhadores chegavam às hortas, aí pelas seis da manhã, o proprietário e o criado de servir, como se chamava neste tempo a este serviçal, já estavam acordados e andavam por ali.

Normalmente, o primeiro trabalho a fazer era dar de comer aos animais, bois, vacas e mula que estavam na ramada ou cabana, e ao porco, que estava na pocilga.. Todos os lavradores daquele tempo, tinham pelo menos um porco para matar no Inverno e alguns tinham dois ou três.

Também era de manhã que se procedia `a limpeza das instalações, cabanas ou pocilgas.

E dava-se comida às galinhas ( aqui no Norte chamam “pitas”) que era aí uma mão cheia de milho outras vezes cevada e vigiava-se a ver se a gineta tinha vindo dar a golpada.

Era giro quando a ninhada de pintos vinha, a mãe dava-lhes toda a atenção e ensinava-lhes os perigos da vida e se algum punha a pata na poça, sofria as consequências disso.

Às sete horas já toda a gente estava nas courelas nos trabalhos de rega ou apanha de frutas da época ou fazendo outro serviço qualquer. Entretanto, a minha mãe que também fazia parte do grupo operário, deixava uma panela a cozer o repolho, batatas e algum toucinho que era a base da alimentação no Inverno.

Esta confecção era para o jantar, porque para o almoço, normalmente, era uma refeição de peixe, que se adquiria aos vendedores que passavam na estrada com as canastras carregando o dito. e as pessoas chamavam de arrieiros.

A mim também me coube o desempenho de algumas tarefas agrícolas, nomeadamente a rega. Dos outros trabalhos nunca cheguei aprender nada, apesar de serem muitos e variados.

As regas começavam cedo por causa do calor. Sobretudo, era na rega do milho onde o calor mais se fazia sentir e onde o homem da rega não se via dentro do milheiral, que lá para as sete horas da manhã tudo começava a girar. Eu era um dos homens de serviço às regas do milheiral..

(continua)

João Brito Sousa

1 comentário:

  1. O trabalho nas Hortas

    Aí está uma boa evocação, numa bela enumeração dos trabalhos outrora levados a cabo nas "finadas" hortas algarvias.
    Os meus avós maternos sempre viveram em Hortas, como caseiros, e eu até nasci numa delas, em Tavira. Durante muitos anos acompanhei toda essa azáfama aí descrita. Mas, meu caro, você "dourou a pírula" em demasia!

    Começando pelo horário de trabalho, a estopada iniciava-se bem de madrugada! É que, para estar na horta às seis da manhã, o sair da cama era bem mais madrugador ainda, particularmente para os elementos femininos, que tinham que preparar o matabicho para o pessoal trabalhador. E tinham, como referiste, que orientar e deixar encaminhadas as refeições para o dia de trabalho que aí estava a bater à porta! E se havia filhos de tenra idade, mais tempo precisavam ainda, antes de pegar ao trabalho, para as lides domésticas! Foram tempos do caraças, perdõe-se-me a expressão! E com que abenegação e resignação era desempenhadas tais tarefas! Não me lembro de ouvir um lamento da boca da minha avó. Os lamentos que passavam lá por casa, naquele tempo, eram quase sempre referentes às surpresas causadas por eventuais ou inesperadas cambiantes climatéricas que poderiam pôr em causa os resultados de uma qualquer produção agrícola. Também ouvia lamentos quando a Castanha ou a 'Telvina - vacas lá do sítio - tinham um parto difícil ou uma das suas tetas se havia inflamado!

    Genuínos amores que coabitavam com as gentes daquele tempo!

    Voltando ao cariz da azáfama hortense, você, meu caro, nem parece que foi um dos homens da rega do milho! Talvez para um mancebo, para quem a vida e seus causticantes afazeres estavam no seu dealbar, a tarefa da rega do milho fosse um trabalho de somenos. Mas aquilo, amigo, era um pincel dos demónios! A altura do milho suplantava a estatura de qualquer ser humano. O sol de Maio e de Junho, pelas nove da manhã, já aquecia bem demais. Andar dentro daqueles milheirais era como caminhar nas chamas de qualquer inferno onde a brotoeja causada pelas barbas das maçarocas do milho agravava sobremaneira os incómodos da rega!

    Àrduos trabalhos manuais que, parece, a moderna tecnologia veio substituir por sistemas de outra eficácia e mais leve desempenho. Até veio substituir - essa moderna tecnologia - a infinita caminhada da pobre mula que passava umas largas horas de olhos vendados, à volta da nora, para que a àgua pudesse chegar ao pé do milho.

    Hortas... de outros tempos!

    Aguardamos a continuidade dessas evocações.

    Até lá....

    arnaldo silva
    felizmente reformado

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