terça-feira, 11 de setembro de 2007

PERSONALIDADES

(magalhãs LIMA)


MAGALHÃES LIMA

Gosto de leituras acerca de vidas de pessoas que foram de algum modo importantes, digamos assim. Magalhães Lima foi um desses Aí vai um pouco da sua vida...

TEXTO RETIRADO DAS CRÓNICAS DE RAUL BRANDÃO

In Memórias (TOMO III)


A Magalhães Lima .


Morreu um dia destes (Dezembro, 1928) Magalhães Lima, grão-mestre da maçonaria que teve inimigos rancorosos. Havia quem mudasse de expressão ao encontrá-lo e um meu amigo disse-me um dia:- Vejo-o sempre coberto de sangue...

Afirmava-se que fora ele quem mandara matar o Sidónio, logo ele, que era incapaz de mandar matar ma mosca..

Morava num segundo andar da Rua do Mundo, numa casa mal mobilada, meia dúzia de cadeiras e coisas insignificantes e gastas. . Não sinto necessidade de conforto, costumava dizer.

Morreu mais cedo talvez por isso, ou talvez por desleixo ou talvez porque não se tratou a tempo como se devia ter tratado. Uma senhora que foi visitá-lo, conta que quis pôr-lhe papas de linhaça e não havia em casa um lenço em termos..

A criada propunha-lhe cortar um pedaço do lençol, mas esse homem rico só tinha quatro lençóis. Resolveram pôr-lhe as papas num papel. Vivia quase como um estudante de Coimbra. Fazia tudo num grande penico e como o penico esbeiçasse, tirou o fundo de palha a uma cadeira para se poder sentar.

Mas não tem outro?... perguntaram-lhe.. e ele... não quero outro. Seria pobreza?.. Não. Magalhães Lima, deixou dinheiro para comprar todos os penicos de Lisboa; mil e seiscentos contos.
Para se lhe entrar em casa subia-se por uma escada carunchosa e sem patamar, que dava a impressão de ser a escada de uma velha nau a desconjuntar-se, e ao fundo da qual havia uma janela com dis vidros partidos. Quem lá entrasse apanhava pelo menos uma constipação.: - Não volto lá enquanto você não mandar pôr os vidros, disse-lhe um amigo .Já escrevi ao senhorio para os mandar pôr...

Tinha um palácio na Rua do Salitre. Mas recebia a renda e era ali na Rua do Mundo, que introduzia os seus, as suas relações internacionais que os procuravam, com um robe de chambre muito antigo e muito gasto e que a criada remendara com um pedaço de saia preta.

Tal era o homem a quem Junqueiro chamou caixeiro-viajante da república. Bom – um pouco fraco- bastante grave e já fora de moda – como um poeta de terceira ordem que teima em viver e em sorrir para o mundo moderno.

Mesmo em novo o seu louro devia ser desbotado. Duma vontade mole, achava talento a toda a gente, o que foi suficiente para não lhe acharem talento nenhum.


João Brito Sousa

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