domingo, 23 de setembro de 2007

DA IMPRENSA


DO DIÁRIO DE NOTÍCIAS


O REGRESSO DE PAUL AUSTER



Depois de vários romances o escritor avança por um duplo (quase) auto-retrato

O regresso de Paul Auster às livrarias faz-se em duas mãos. Numa mão, o seu último romance, ou melhor um longo monólogo com personagens que foi buscar aos seus livros. Na outra mão, um guião para o filme que ocupou as últimas duas dezenas de meses de vida, passadas entre filmagens e montagem, e que também retoma o fio de uma história incluída num romance anterior: o Livro das Ilusões.


O regresso de Paul Auster a Portugal vai acontecer também fisicamente, pois na primeira quinzena de Outubro irá estar em Portugal para a estreia do filme que corresponde a um desses dois volumes que agora se publicam: Viagens no Scriptorium e A Vida Interior de Martin Frost.


O regresso de Paul Auster tem assim um duplo sentido, o do escritor e o do escritor/cineasta. O regresso de Paul Auster confronta-nos com um balanço sobre esse criador norte-americano, que desde o atentado do 11 de Setembro ficou amargo com a política do seu país e que é mais acarinhado na Europa que nos EUA.


Que se antecipou em Leviathan à violência terrorista e no Palácio da Lua às questões que fazem os habitantes deambularem pelo seu mundo em busca de paz. O regresso de Paul Auster nestes dois livros une o que é impossível, a crise perante a folha em branco e a explicação do papel da musa na criação.


É assim, como os dois lados da moeda, duas mãos a fazerem o que só uma não consegue, mesmo sendo prosas num estilo bem diferente, como convém ao romance e ao guião. O regresso de Paul Auster em Viagens no Scriptorium é uma surpresa - cujo fim não se vai aqui desvendar para mal deste texto - porque o modo como o autor leva a espiral de páginas a desembocar num fim aglutinador é inesperado.


Anda-se de página em página do único capítulo que faz o livro sem se entender o objectivo a que nos quer transportar, só ao terminarmos a sua leitura é que se entende o significado que cada parte quer dizer no todo, porque estas reflexões que pretensamente são de um tal sr. Blank podem ser assumidas como confissões do próprio autor.


Curiosamente, é a capa deste Scriptorium que nos vai dar algumas das chaves para a compreensão da leitura - felizmente a edição portuguesa utilizou-a -, que é de difícil trato. Quase parece que a narrativa é como a água que rodopia pelo cano abaixo sem sabermos qual é o seu destino, talvez acabe no mar. E neste livro esse mar é o da obra do autor, fazendo deste um livro indispensável para o entendimento do seu processo criativo. Claro que quem for à procura de um romance à Auster sairá frustrado, mas quem desejar entrar no monólogo como ouvinte, sairá recompensado.


O regresso de Paul Auster em Martin Frost segue o modelo já percorrido em Lulu On The Bridge, por exemplo, mas desta vez o autor foi muito mais longe no despojamento literário por desejar obter a sua própria linguagem cinematográfica. A entrevista que acompanha o volume explica o que o guião não permite sem se ter visto o filme.


Recolha de João Brito Sousa

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