segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

A FORÇA DO PODER


SÓCRATES E A MALTA
(retirado da Visão)

A tribo dos atletas populares funciona como uma espécie de santuário de recuo para José Sócrates.

O primeiro-ministro mistura-se no pelotão, faz-se à estrada e, contra todas as probabilidades, é aplaudido. Aconteceu em Viana do Castelo: banho de multidão, fotografias e beijinhos. Quando se calça uns ténis velhos e se mistura a nossa T-shirt desbotada do sol a sol do jogging matinal, e das centenas de lavagens, com as T-shirts dos corredores de fim-de-semana, numa prova popular, passamos a ser um deles.

Até o sindicalista mais encarniçado ou o desempregado mais ressabiado com o Governo despe a sua farda contestatária e recebe o primeiro-ministro como um compagnon de route. É verdade que é preciso ter uma certa coragem – e Sócrates tem-na – ou, pelo menos, algum espírito provocatório, para se misturar com o povo numa prova de estrada, nesta altura.

Fecho de urgências, desemprego, impostos… E daí? O homem corre connosco. Deus está no meio de nós.

É verdade que o ex-primeiro-ministro sueco Olof Palme foi abatido quando, como qualquer cidadão, saía de uma sala de cinema. E que Sócrates corre entre 2500 «patuscos», no preciso momento em que o País sofre um alerta terrorista. Imagine-se Zapatero a fazer isto. Bem, a verdade é que os espanhóis nunca pegaram os touros de caras. Esse trabalho viril é um exclusivo dos nossos forcados.

A corrida presta-se à reflexão. Em que pensa um corredor enquanto as suas pernas devoram quilómetros? Em que ocupará o espírito? Este, talvez na mil vezes anunciada, propalada ou exigida remodelação, por exemplo.

Cavaco Silva remodelava de surpresa, «pela calada da noite», sacrificando os bodes expiatórios mais à mão. Guterres passava noites em claro, na angústia pré-parto das suas numerosas remodelações. Sócrates quer entrar no Guinness com o Governo (quase intacto) mais duradouro.

A sua mentalidade e modus faciendi são diferentes daquilo a que estávamos habituados. Os ministros de Cavaco eram ajudantes? Os de Sócrates são executantes.

O povo queima a fotografia do ministro da Saúde, nas vilas e aldeias do país, como o de George W. Bush nas manifs da rua árabe? Não interessa: Correia de Campos não tem existência própria, apenas cumpre o programa de uma entidade abstracta chamada Governo.

Mário Lino muda de ideias sobre a localização do aeroporto? Pois é Sócrates quem anuncia a decisão. Os ministros são emanações de São Bento. O Governo só tem uma política. A Cultura nunca se queixou de falta de verbas das Finanças. O Ambiente não protesta contra os impactos ambientais das obras públicas.

A Educação não tem ciúmes dos computadores distribuídos nas escolas pela Ciência. O Governo é um balneário blindado, um FC do Porto de fato e gravata. Sócrates é um Pinto da Costa.

As sondagens aguentam-se, a oposição inexiste… remodelar para quê? As urgências fecham sem que os critérios para o fecho sejam explicados.

O desemprego aumenta, apesar dos mais de 100 mil novos empregos. Desconfia-se que a inflação suba para além das previsões, sem que os salários acompanhem. A Economia degrada-se, contra o discurso do oásis. O défice impõe a sua ditadura. Mas a caravana passa.

E Sócrates corre… Em vez de correr com ministros esgotados ou desgastados pela longa maratona de quase três anos de Governo. É que não é preciso.

MEU COMENTÁRIO

E quando é que somos felizes?
O Jorge Palma já disse para não perdermos tempo em tentarmos ser felizes.
Razão parece ter o Baptista-Bastos quando disse que não foi este o País que me prometeram.
Você reza?.. e um copo de aguardente vai?... parece que é a melhor maneira de acabar isto.

João Brito Sousa

1 comentário:

  1. Democracias de hoje...

    O artigo da Visão que o amigo Brito aqui traz tão oportunamente provoca, para além do agravar do sentimento dos nossos achaques que, no dia a dia da nossa labuta de sobrevivência, vamos sentindo, provoca, dizia eu, um impulso de reflexão sobre o sistema de governação dos povos pelo sistema das actuais Democracias.

    É verdade incontestável que toda a sociedade necessita de um governo que a discipline e faça a gestão do seu património comum.
    É igualmente verdade que gorvernar uma sociedade necessariamente traz descontentamento a uma parte dessa sociedade, pois é comprovadamente certo que "é impossível agradar a gregos e a troianos".
    Também não é menos verdade que haverá sempre "velhos do Restelo", vozes discordantes e críticas, para se oporem às medidas tomadas por qualquer governo, dado que "cada cabeça, sua sentença".

    Encontraram as sociedades hodiernas esta forma de governação, dita democrática, assente na trilogia de um Presidente, um Governo e uma Assembleia da República. Aquele será o garante do funciomento das instituições democraticas, o outro está cometido das tarefas executivas da gestão do património comum e a AR ocupar-se-á de dar corpo e força, pelo processo legislativo, às relações e aos comportamentos dos vários elementos da sociedade. Lindo! Maravilhoso, nos seus pessupostos! Mas...

    Mas, onde está a força do poder popular, génese do sistema democrático?!
    Todos os elementos do sistema, acima referidos, receberam do povo eleitor, o "poder" de que se encontram empossados. Exercem as suas funções escudados nesse "poder", defendidos pelo acometimento de um mandato que lhes vai parar às mãos por via do voto, dado na esperança de que eles irão ser os fiéis executantes das promessas que apresentaram nos programas eleitorais, aquando da sua candidatura ao aos postos políticos em aberto.

    Chegados à cadeira do poder, as promessas eleitorais foram rapidamente esquecidas e surgem medidas que ferem os sentimentos dos próprios eleitores. E que faz então o sistema?! NADA!!!

    O presidente, de vez em quando, sugere que se altere a redacção de um ou outro artigo, a coberto da opinião de um Tribunal Constitucional. Mudam-se as moscas e a lei passa aprovada.A AR, fiscalizadora das acções governativas, ouve o Primeiro Ministro e sua "troupe" uma ou duas vezes por mês, respondendo a umas "bocas" da chamada Oposição, isto é, daqueles cujo partido não obteve tantos votos como o partido do Governo. E ficamos por aqui. Melhor, ficamos com as medidas impostas pelo Governo e os protestos inatendidos dos votantes, ora vítimas das medidas tomadas. E segue a Democracia... Pisando os calos dos votantes vitimados por medidas que desaprova.

    E que se passa no sistema, dito democrático?! O votante, aquele que no sistema dispõe do verdadeiro poder para conferir poder aos seus mandatários, o tal poder sem o qual estes não poderiam tomar medidas governativas, nada pode fazer para alterar o estado das coisas!!!! NADA!!!

    É por via desta impotência, seja a impossibilidade de retirar o poder conferido, que o amigo Sócrates se pode permitir fazer parte de um grupo popular de maratonistas, sem preocupações, sem necessidade de pensar muito durante o tempo gasto no percurso. O seu posto de trabalho está garantido até ao fim do mandato! Quando chegar à altura de renovar o "contrato de trabalho" então se pensará em agradar ao patrão, aos votantes , dando-lhes o rebuçado de um ridículo aumento do Abono de Família, actualizando numa mísera taxa as pensões de reforma ou reduzindo arbitraria e intempestivamente o IRS. Depois acena-se-lhes com novo caderno de promessas para o novo termo do "contrato de trabalho" , e o circuito volta a repetir-se.

    É o sistema dito Democrático que temos. É com ele que o Sr. Sócrates conta para se arvorar o chefe que pode e manda, porque o patrão está reduzido à insignificância de espectador e vítima desse sistema.

    E vamos vivendo...

    Arnaldo silva
    Felizmente reformado

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