terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

LITERATURA

(Lídia JORGE)
A DEMOLIÇÃO DO MUNDO ARCAICO


Em O Vento Assobiando nas Gruas Lídia Jorge fala do fim de culturas milenares

Com O Vento Assobiando nas Gruas, a escritora Lídia Jorge conquistou há cinco anos o grande prémio de romance da Associação Portuguesa de Escritores. O livro é um ambicioso trabalho literário com quase 500 páginas, leva o leitor à aldeia de Valmares, cenário fictício de outros livros da escritora que remete à terra onde ela nasceu, no Algarve. Nesse oitavo romance da autora, o vento mediterrâneo do título sopra e ameaça uma cultura ancestral, resistente ao avanço das gruas que remexem a terra do mundo globalizado.

No livro, Milene, neta de uma mulher encontrada morta em frente a uma antiga fábrica de conservas de Valmares, conhece Antonino, um viúvo operador de gruas com quem estabelece uma relação. Por meio da história dos dois, Lídia Jorge mostra o confronto entre um mundo arcaico, representado pela velha fábrica onde se instala uma família pobre de Cabo Verde, e a modernidade.

O Vento Assobiando nas Gruas desenvolve-se em torno de uma figura muito particular, a 'inocente' Milene, a personagem que veste a pele da pessoa comum, e não da pessoa anormal. O livro abre devagar, exactamente para ficarmos ao lado da figura, entendendo-a por dentro, e assim tomarmos o seu partido e perceber o ponto de vista desta mulher que pensava e agia como uma criança.

Milene e Osvaldo Campos, contam a sua história de perdição. Mas não se trata de um fiasco. O fiasco acontece na vida, se eles vivessem e as suas vidas fossem assim. Mas, uma vez que as suas vidas são contadas, as suas histórias reclamam a reposição da 'justiça' que não é feita dentro das páginas.

Um bom livro é aquele que tem a força suficiente para continuar a existir na nossa cabeça, quando fechamos a última página e a força da história é tanta que nos deixa para sempre atraídos pela sua beleza e incomodados pela imperfeição do que acontece. Só assim as figuras literárias ficam nossas irmãs e os livros podem ser nossos companheiros para sempre.

Retirado do Estdo de S. Paulo
por
João Brito Sousa

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