segunda-feira, 12 de maio de 2008

IMPRENSA/ EXPRESSO


TUDO CONTRA SÓCRATES ... À DIREITA E À ESQUERDA
por Pires de Lima

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
Em 2004 os deputados José Sócrates e Vieira da Silva contaram-se como dos mais ferozes críticos do apelidado ‘código de Bagão Félix’. O segundo terá participado mesmo naquelas ruidosas manifestações organizadas pelos sindicatos que, urrando insultos, anunciavam o fim dos tempos caso o Código fosse aplicado.

Os governantes José Sócrates e Vieira da Silva decidiram avançar em 2008 com propostas de alteração ao código do trabalho. Será que as mudanças agora propostas pelos socialistas visam repor as regras vigentes antes dos governos PSD/CDS, desde logo as alterações mais criticadas por Vieira da Silva, como a caducidade dos contratos colectivos quando uma das partes se recusa a negociar ou o alargamento do tempo de férias? Claro que não. É como dizia o poeta: mudam-se os tempos, mudam-se as vontades! Ou, em linguagem politiquês, a “situação de 2003 é diferente da de 2008”. Vieira da Silva dixit.

O que era péssimo antes, virou uma boa base de trabalho. Como não podia deixar de o ser? Lembre-se o exemplo da contratação colectiva: foi dinamizada com o ‘código Bagão Félix’ e, só em 2007, 1,6 milhões de trabalhadores - o valor mais alto desde 1996 - estavam ao coberto deste tipo de negociação. Daí que nas palavras envergonhadas do agora ministro da Segurança Social, o código de Bagão Félix “teve mérito... mas não excessivo”. Quem diria?

Ressalvada a incoerência, uma prática pouco abonatória e recorrente na governação de Sócrates, o que importa agora começar por reconhecer é a coragem de, a um ano de eleições, um governo que já conheceu melhores dias, avançar com propostas supostamente flexibilizadoras das relações laborais. A contestação grotesca por parte dos sindicatos já começou e, creio, não vai dar

tréguas ao governo durante o próximo ano. Valerá a pena o bom esforço de Sócrates?

Vejo como positivas as propostas que projectam flexibilidade e adaptabilidade no trabalho já adquirido, procurando acomodar a força de trabalho às necessidades e ritmos das empresas num mundo moderno que não se compadece com excessiva rigidez laboral. São também arrojadas e muito positivas as propostas que vão no sentido de conjugar melhor maternidade com vida profissional.

No entanto - e atendendo ao ruído que aí vem - lamento que as propostas socialistas não toquem no essencial, o despedimento individual. Ou procurem lá chegar de forma enviesada e pouco séria. O argumento da ‘inadaptação’ é propício a juízos ambíguos e a todo o tipo de abusos.

Preferível seria que o governo aceitasse a regra do despedimento sem justa causa com indemnizações pré-definidas e substanciais (pelo menos, 1,5 meses por cada ano de trabalho, com seis meses de salário como «plafond» mínimo). Com regras claras como esta, os trabalhadores quando dispensáveis estariam melhor protegidos.

Em nome da flexibilidade avançou o governo com propostas de revisão do código. Ao optar-se por penalizar os contratos a termo, não se abrindo portas objectivas para a dispensa de trabalhadores, corre-se o sério risco do “tiro sair pela culatra”. Terminaremos a legislatura com leis laborais ainda mais rígidas do que antes? Assim sendo, não irá diminuir o desemprego jovem, um dos maiores flagelos sociais com que nos confrontamos e que impede a renovação e a modernização de muitas empresas em Portugal.

Sócrates decidiu comprar uma guerra com os sindicatos. Vai custar-lhe caro e irá beneficiar eleitoralmente os partidos extremistas à sua esquerda. Uma guerra que valeria a pena se a proposta socialista fosse ao essencial do que precisa ser modificado. Não me parece que seja o caso.

Publicação de
João Brito Sousa

Sem comentários:

Enviar um comentário