domingo, 11 de maio de 2008

IMPRENSA/ EXPRESSO


BOB GELDOF e o GOVERNO de ANGOLA

Geldof disse uma coisa que quase todos nós sabemos e quase sempre calamos por pura conveniência. Mas deveremos viver sempre num silêncio cúmplice ou temos o dever da verdade ainda que inconveniente? Por mim, não tenho dúvidas

Esta é uma posição pessoal, mas é uma posição que, em consciência, não posso deixar de tomar.
Compreendo que a voz dos negócios não seja a voz política, mas a dos interesses. E respeito a prudência de quem fala quando pode e cala quando deve. Mas o jornalismo não se fez para isso, pelo contrário.

Também respeito os interesses do Estado, embora neste ponto duvide do excesso de reverência com que tratamos Angola. Mas eu não sou o Estado, sou um jornalista que, apesar de ter visitado Angola diversas vezes em reportagem, há muito não vai lá. Mas que há muito segue com interesse o que lá se passa. E é com toda a tranquilidade que afirmo: penso que Bob Geldof tem toda a razão.

Indignamo-nos com o Zimbabwe, mas esquecemos que as únicas eleições em Angola foram no já longínquo ano de 1992. E que as presidenciais nem sequer chegaram ao fim, pois os resultados indicavam uma segunda volta. Seguiu-se um massacre em Luanda (culpas divididas entre Unita e Governo) e depois uma guerra que terminou com o assassínio de Savimbi, que era ele próprio um assassino.

Depois, os interesses, o petróleo, os diamantes fizeram esquecer a necessidade da democracia, da dignidade pessoal, da entreajuda, do auxílio aos que passam fome e morrem de doenças banais. Angola é um «farwest», é uma terra gerida há tempo demais por gente sem escrúpulos que apenas pensa no seu enriquecimento pessoal. É um país com leis que dependem do estatuto e do dinheiro de cada um.

Todos os empresários portugueses, todos os trabalhadores portugueses em Angola o sabem.


Apenas o escondem por medo de perder o emprego ou por medo de perder o negócio. E Angola trata-nos ao nível dos medrosos, com a arrogância do ‘quero, posso e mando’. Dou graças a Deus por Angola não ser uma potência dominante no mundo. Ao lado daquele Governo até Bush parece um santo!

Quando Mário Soares chamou a Angola uma “cleptocracia”, ou seja, um governo de ladrões, tinha razão. O que Geldof disse que fez correr tanta tinta é uma coisa que todos nós sabemos - aqui e em Angola - mas calamos por via de duas conveniências: uma é a do politicamente correcto, do facto de sermos a ex-potência colonial (mas dizer que Angola é assim por causa do colonialismo era como dizer em 1968 que a ditadura de Salazar se mantinha por causa da República); a outra é a conveniência dos interesses. Quem não tem vergonha nem culpa da nossa História nem interesses em Angola pode falar com liberdade.

Foi o que fez Bob Geldof!

publicação de

JOÃO BRITO SOUSA

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