quarta-feira, 30 de julho de 2008

IMPRENSA /JN


Condenados a ser criativos
PEDRO IVO CARVALHO

O Porto tem de decidir o que quer ser: uma cidade que se projecta à custa do F.C. Porto, Património da Humanidade ou outra coisa qualquer, permeável às circunstâncias de cada momento?

Tragicamente para nós, que vivemos no Porto, somos, muitas vezes, apresentados como geneticamente regionalistas, parolos q.b., falantes de boca cheia e orgulhosos em permanecer acantonados nesta espécie de aldeia gaulesa, berrando exigências que, quando chegam ao segundo terço do mapa luso, são meros sussurros. A capital serve-se, não raramente, deste preconceito para não perder tempo a ouvir-nos. Porque, contemporizam alguns, Portugal é demasiado pequeno para ser partido em dois. E o que fazemos nós, no Porto, no Norte? Combatemos as assimetrias? Apresentamos alternativas? Ou andamos apenas e só distraídos a desembainhar espadas contra Lisboa?

Charles Landry, especialista mundial em levantar cidades das cinzas, lançou, há dias, na Fundação de Serralves, um alerta pertinente: o Porto precisa de "repensar os seus mitos".

No fundo, temos de decidir o que queremos ser. Uma cidade-região que se projecta à sombra dos êxitos desportivos do Futebol Clube do Porto?

Uma granítica e castiça urbe encostada ao pomposo título de Património da Humanidade (ou da desumanidade, se atentarmos em algumas nódoas do Centro Histórico)? Um santuário para o universo de apreciadores do vinho do Porto? Ou outra coisa qualquer, indefinida, permeável às circunstâncias de cada momento?

Defende este britânico que o Porto deve ser, acima de tudo, uma região criativa, onde se forme um cluster - ou seja, um pólo de competitividade - que absorva a melhor das matérias-primas, aliando cultura e economia, universidade e empresariado. Artistas. E políticos, já agora.

Confesso que a proposta, de tão criativa, me agrada. Mas também confesso que a palavra cluster me começa já a provocar urticária. Em pouco tempo, nesta região, o anglicismo popularizado pelo economista Michael Porter já esteve associado à saúde e às indústrias marinhas. E agora às indústrias criativas.

Temo, fundamentalmente, que o ar modernaço que estes projectos emprestam a quem a eles se associa acabe por não ter repercussão prática. Sobretudo porque a História nos mostra que aquela que foi, durante anos, a mais romântica ideia da região - o metro do Porto - continua aprisionada na criatividade das desculpas que o Governo vai dando para não aprovar o seu crescimento para Gondomar, Trofa, zona ocidental do Porto e a extensão, em Gaia, até Laborim.


E não parece adiantar muito protestar, como tem feito, e bem, Rui Rio, presidente da Junta Metropolitana do Porto. Há coisas que nos afectam a nós mas que dependem fatalmente dos outros. Estamos, está visto, condenados a ser criativos.
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COMENTÁRIO

Ora aqui está um bom assunto para debater. Não aceito que a cidade do Porto se pretenda projectar à sombra dos êxitos do FCPorto. Porque isso é faltar o respeito à cidade.

Texto de

João Brito Sousa

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