por Fernando Madrinha
É a primeira vez que um Governo está autorizado a fazer eleitoralismo sem ser condenado por isso Alterar tamanho Desde que chegou à liderança do PSD, Manuela Ferreira Leite optou por falar pouco, de modo a fugir à cacofonia política e dar mais força àquilo que diz quando, por fim, decide intervir. Era uma boa ideia. Os eleitores estão cansados de palavras vazias e de promessas furadas. Mas a líder do PSD levou tão a peito essa ideia que aquilo que se apresentava como uma opção táctica inteligente, desde que usada na medida certa, se tornou numa espécie de vício. Ou numa nova obsessão, para usarmos o termo a que, enquanto ministra das Finanças, Manuela recorreu um dia para definir a sua preocupação com o défice: a obsessão da mudez.
Esta ideia fixa de impor os seus próprios tempos e os seus próprios temas, evitando o comentário pontual sobre os assuntos que fazem a actualidade, leva a que a líder do PSD fique sempre à margem da discussão dos temas que realmente preocupam os eleitores. Por mais importante e controverso que seja o reconhecimento do Kosovo, por exemplo, ninguém compreende uma audiência “urgente” com o Presidente da República - uma audiência que o PSD nem se deu ao trabalho de explicar - quando a crise financeira ameaça virar o mundo do avesso e pouco se sabe sobre o que pensa disso a líder da oposição.Luís Filipe Menezes tinha a obsessão oposta - a de estar sempre ‘no ar’ - e Manuela Ferreira Leite quis marcar a diferença. Muito bem. Mas nos tempos de perturbação e ansiedade em que vivemos, não pode esquivar-se à opinião sobre as mudanças extraordinárias a que o mundo assiste diariamente.
E de uma pessoa que, além de ser candidata a primeira-ministra, tem formação e experiência na área das Finanças, espera-se muito mais do que dois ou três comentários avulsos e desconexos a zurzir o Governo.A obsessão da agenda própria dá coisas ridículas como esta: a recusa em comentar o discurso do Presidente da República na cerimónia oficial do 5 de Outubro, que Manuela ouviu pessoalmente do princípio ao fim. Foi Paulo Rangel, o líder parlamentar do PSD, quem veio comentar, depois de todos os outros partidos o terem feito. Rangel é um político inteligente e arguto, sério na argumentação e com uma formação sólida - talvez a mais consistente e talentosa revelação da política portuguesa nos últimos anos.
Lá justificou o silêncio da líder alegando que, para fundamentar uma opinião, era preciso ler com atenção o que disse o Presidente - algo que só diminuiu Manuela na comparação com os outros dirigentes, começando pelo primeiro-ministro.A líder do PSD quis inaugurar um novo estilo e está a consegui-lo: é o estilo da líder ausente. Mas este estilo tem um pequeno problema. Nenhum eleitor se mobiliza para o voto num partido da oposição se a sua líder fugir a pronunciar-se e a apresentar propostas que o diferenciem do partido governamental. Disse Manuela um dia que o calado é o melhor porque, assim, os jornais só falam “das asneiras que o Governo faz”. Engana-se. Desde logo, o Governo não faz só asneiras. Depois, o país precisa de contrapontos e de alternativas ao poder socialista - e espera esse contributo do PSD. Além disso, para tornar as coisas ainda mais complicadas, vivemos uma situação original e com o seu quê de irónico.
Depois de três anos atribulados por força do défice, depois dos insultos na rua, depois de lapidarmente frustradas todas as suas esperanças de um fim de mandato simpático para os eleitores, a mesma crise que sufoca o país dá um novo fôlego ao Governo que pode revelar-se fatal para o PSD: esta deve ser a primeira vez que, em ano de eleições, um Executivo em funções está autorizado a tomar todas as medidas populares que entenda sem que seja condenado por eleitoralismo. Os silêncios de Manuela não têm, pois, explicação. São apenas um sintoma e um disfarce da sua fragilidade como líder e da sua enorme solidão à frente do PSD.CIP vira à esquerda Opresidente da CIP converteu-se ao socialismo? É o que parece. De outro modo, seria impossível tê-lo ouvido afirmar que não o chocaria o facto de o Estado vir a orientar a economia “por uns anos”.
“Desde que não seja para sempre”, acrescentou. Compreende-se. Desde que seja apenas enquanto for necessário o dinheiro do Estado para resistir à crise e até que o risco no mundo dos negócios esteja reduzido ao mínimo, isto é, até o famoso mercado propiciar de novo lucros dignos desse nome.Que o suposto ‘patrão dos patrões’ venha dizer, não que o Estado deve ajudar pontualmente as empresas a vencer as suas dificuldades, mas sim “orientar a economia por uns anos”, é muito mais do que têm dito e feito as mais recentes e improváveis ‘esquerdas’ por esse mundo fora, desde Bush a Merkel, passando por Brown. Num país onde os empresários se habituaram a viver “encostados” ao Estado, como recordou esta semana o Presidente da República, a confissão de Francisco Van Zeller aparece com toda a lógica e naturalidade.É por causa desta tradição do ‘encosto’ que o Governo tem a obrigação de ser cauteloso. E de resistir quanto puder às pressões para despejar os milhões que provenham do mais que previsível aumento do défice em 2009, depois de uma redução histórica alcançada com o sacrifício de todos, nas empresas de alguns que sempre viveram “encostados”.
E que não deixarão de aparecer, agora que existe uma predisposição geral para o Estado intervir, a fim de se ‘encostarem’ ainda mais do que na realidade precisam.
publicação de
JBS
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