terça-feira, 11 de novembro de 2008

CAPANULÁCEAS


2008.11.11

CAMPANULÁCEAS

Era Setembro, e tantas manhãs, tantas noites, tantas definições do indefinível... Esta frase, é do escritor Baptista Bastos em “A Cara da Gente” e a frase que vem a seguir também: “era uma rua perfumada com os odores provindos das campanuláceas e das rosas, dezenas e dezenas, nos jardins suspensos da Iluminante..

Campanuláceas... a palavra ficou-me e desconhecendo-a fui ao dicionário ver o que era. Afinal nada de especial, ervas, arbustos, árvores...Mas o diabo é que engracei com a palavra e trauteava-a numa canção cuja música inventei `a pressa De manhã, lá estava eu encostado á janela, trauteando, campanulácea si vá...E a minha mulher perguntava que chilreada era aquela.... É o Armando Baptista Bastos que inventou esta palavra, disse eu. É o trabalho do escritor meu velho, dizia-me a minha mulher.

O escritor inventa, perguntei?... O escritor cria, dizia-me ela. Ora bolas, e eu que estou a escrever um livro ainda não criei nada.!...

Foi nesta altura que me lembrei duma crítica literária do Luiz Pacheco ao Dinis Machado, recentemente falecido, dizendo bem, melhor, dizendo muito bem, da obra “O Que Diz Molero”., o que é raro nele. Jorge Listopad também fala bem do autor. Então é porque a obra é mesmo boa, recomenda-se, portanto.

Disseram-me hoje de manhã que Portugal é o único País do mundo que possui dois intelectuais do calibre de Agostinho da Silva e de Eduardo Lourenço, pensadores por excelência. E aceito a ideia.. Sobre o último disse Rui Vilar, presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, na abertura do Congresso Internacional dedicado àquela grande figura.“Eduardo Lourenço é uma figura ímpar na cultura portuguesa. Pela densidade, originalidade, mobilidade e independência da sua obra.

Ouvi-lo ou lê-lo (e às vezes relê-lo, porque é necessário) é recebermos um tónus vivificador do espírito e supreendermo-nos pela vastidão das suas referências, que surgem com tal naturalidade como se houvesse sempre toda uma biblioteca aberta pela sua frente”

E agora uma dúvida me ocorre e pergunto-me. A economia mundial está mal porquê? Qual o contributo da cultura para resolver a crise? Houve contributo? Deverá haver mais? Consulto textos do velho António Lobo Antunes e é ele que diz, entre um economista e um padeiro prefere o padeiro. É a Literatura a desconfiar.

Volto ao autor das campanuláceas e leio “a grande literatura comporta, em si mesma, uma dose substancial de lirismo. Mesmo que o não demonstre, cada livro é uma estrofe contra a catástrofe”. Por aqui verifico que a Literatura não falhou; esteve lá. Mas pelos vistos a dose de intervenção não chegou. O trabalho do escritor é um trabalho solitário, pejado de vozes e de gritos, de gestos e de olhares e o seu destino é jogado em cada livro, diz ainda Baptista Bastos, que continua dizendo, na literatura compete-se como nas outras áreas da vida. Às vezes chega- se ao topo e a fama vem.

Mas a fama para o escritor é como a prostituta que se entrega nos braços de todos e de ninguém. Está a aproximar-se outro que vai arrebatar a flâmula, até chegar o que está para vir. Cada escritor é um pobre de Cristo que aguarda, inquieto e dedicado, o afecto confiado de quem o lê.

Mas é inútil ser o melhor!...

publicação de
JBS

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